sábado, 23 de maio de 2015

O Tempo é Vida

Andei muito, muito tempo envolvida com politicagem, da feia, da grossa; daquela pseudo-política que machuca; deixei o tempo escapar pelo vão dos dedos.
Andei mais um bocado de tempo a matutar sobre o verdadeiro ton de azul dos olhos de vovô Maneco e se os olhos de minha mãe eram azuis ou verdes...
Gastei horas com as coisas de fora, coisas sem valor, quase bobagens mesmo. Um bom feixe de horas foi investido matando lagartas que teimam em matar meu manacá - de novo! Quando dei por mim, já era fim de abril e eu lutando contra artrite com armas pouco convencionais: fingia que não sentia dores, mas estas arranhavam-me os olhos e o couro cabeludo; apertavam todas as articulações e a irritação do sono só de pesadelos fez-me irritada e chata...

Não conseguia ler nem escrever nem conversar eu queria. Para completar, a gripe gritou exigindo seu tempo de atuação. Nesse quadro de negação total de dias normais, não percebia o dourado do sol beijando as ramagens nem a leveza da trepadeira, carregada do carmim das rosinhas minúsculas. Não me entretinha com o canto do sabiá, não pendurava banana para o sanhaço, não falava mais com beija- flores. Era como se tudo tivesse saido do seu contexto: sem cor, sem som, sem encanto - tudo apagado pela dor física e pelo lixo emocional que eu deixara acumular em meu espírito e ruminava nos momentos de puro silêncio. Era a violência, a corrupção, a roubalheira, a hipocrisia e o cinismo de muitos. Era uma pátria à deriva, sem comandante, sem rumo!.

E o Tempo continuou girando, porque ele, o Tempo, faz seu serviço sem parar.

Foi então que percebi que meus encontros comigo mesma, minhas conversas com meu Mestre e Senhor estavam muito contaminadas. Eu poderia ter pensado tudo o que pensei, sofrido todo o pequeno - grande sofrimento que sofri de modo muito mais suave e produtivo se tivesse ido ao encontro d'Ele em profundidade e entrega. Mas ainda tinha tempo. Voltei a minha capela interior. Ali, o tempo parou. No silêncio de meu coração, acendeu-se a Luz! Sosseguei o espírito no Espírito e a paz escorria em alegria que penetrou cada poro de meu corpo...O Senhor me ensinou que nosso tempo é precioso. Não é para vivermos na correria, na agitação. Também não deixar o tempo esvair-se como o sangue que sai de ferida mal cuidada. O tempo deve ser acariciado com bela música, boa leitura, com amigos, com as minhas crianças. Sobretudo aos pés do Senhor, devo viver o meu precioso tempo!

Saindo da capela interior, estou tomando umas coisinhas para artrite, outras coisinhas para o resfriado e a vida está entrando de novo nos trilhos. Hoje, já matei lagartas arrogantes, reguei plantas sedentas e lacrimosas; cuidei do sanhaço e sondei o beija-flor que não veio. Mas sei que virá.

Vi que o tempo gira e gira muito depressa, sobretudo se não estamos construindo na paz que vem de Deus. E, se o tempo gira e nada se faz nele é vida que se perde. E vida perdida gera aquele olhar de zumbi que ve tudo sem cor e sem sentido. Estou feliz; voltei à vida!