segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Presépios

Vai chegando o Natal e logo vejo as fachadas de residências e lojas iluminadas com as pequenas lâmpadas coloridas. Nas praças públicas e nos centros comerciais, as árvores de Natal, sempre em pinheiros naturais ou artificiais, foram - se impondo e dominam, seduzem, encantam.

De repente, não muito de repente, comecei a refletir que que Árvore de Natal e Papai Noel são aquisições quase impostas, uma espécie de carimbo do Primeiro Mundo. E faz algum tempo que me tornei intolerante quanto a estes pinheiros artificiais, alguns ridiculamente revestidos de flocos de algodão, neste " país tropical, abençoado por Deus" - como se aqui nevasse! Questionava ainda, porque tinham sumido com os Presépios? De um momento para o outro, apenas algumas igrejas católicas fazem o Presépio. Mesmo que alguém argumentasse que tal manjedoura, aquele cenário rural, e a singela família só devessem aparecer a partir de 25 de dezembro, o que se constata é que o Natal despiu- se de piedade. Sua harmoniosa alegria ficou abafada pelas multidões à cata de um presente adequado para familiares e para o amigo secreto, nem muito secreto e, tomara seja amigo e não apenas um colega de trabalho...

Natal sem presépio não é Natal. Que festa é esta em que se enfeita a casa, prepara-se rico jantar, vestem-se de seda mas a Pessoa Central que daria sentido à celebração, fica de fora? Adultos não falam dele e as crianças, cada vez mais individualistas, só pensam nos presentes que vão ganhar. Nos Presentes; porque as crianças, em geral, não mais se satisfazem com um só presente. Muito triste isso.

Quando eu era criança - este quando já vai longe - logo no início de dezembro minha avó pedia ao meu tio para retirar um enorme caixote de madeira que vivia no porão. Este lugar era alto o bastante para uma pessoa de média estatura ficar em pé. O caixote tinha mais ou menos um metro cúbico e nossa ansiedade para retirarmos o que lá adormecia se revelava em gritinhos e um saltitar que quase aborrecia nosso tio.

Com cuidado, minha avó e sua empregada levantavam o caixote de um lado e meu tio do outro. Subiam a íngreme escada do quintal, como quem levasse um andor. Na sala de jantar, como acontecia em cada dezembro, o Presépio era montado sobre o " étagère ", nome este dado a um simples aparador ou sobre uma mesa, emprestada à cozinha. O móvel era recoberto por uma longa toalha que chegava ao chão. Eu e outros irmãos ou primos, íamos desembrulhando peça por peça, que estavam protegidas por lascas de serradura, aquele amontoado de fitas finas de madeira semelhantes à serpentina de carnaval. E arrumávamos um gramado e céu com o cometa, a luzir esperança.
As peças desse misterioso e precioso Presépio foram importadas da Itália e, não sendo novas, uma ou outra tinha arranhões, mesmo trincas e marcas de colagem. Eram peças grandes sabendo-se um Presépio doméstico. E lá ficavam os pastores e suas ovelhas, os animais do estábulo e a santa família, em Belém...

Minha avó recebia muitas visitas desde o início de dezembro até janeiro, quando então, colocava os tres reis do Oriente, com seus presentes para o Menino - Jesus. E a rua inteira, crianças e adultos deslumbravam-se diante daquela cena campestre que nos elevava aos céus!
Bons tempos: nada de árvores, nada de papai Noel. O brilho que ali brilhava era a luz das pessoas simples e puras que acreditavam que milagres acontecem.

domingo, 30 de novembro de 2014

Homenagem à Academia de Letras José de Alencar

Diamante Lapidado

Você, como criança,
foi dada à Curitiba
como um diamante bruto...
Valioso, cheio de possibilidades,
promessas infinitas. Só promessas.
Ao longo de setenta e cinco anos,
você cresceu e se tornou madura,
pelo trabalho, pela vida dura
de quem a ama até por vontade divina!
A cada dia vivido, podada uma aresta,
vergado ou esticado cada ramo...
Em cada reunião, uma festa,
pelo simples enlevo do encontro.
Todo momento esculpido,
na disciplina, na escolha e no suor.
Sempre com amor...
Agora você, cara ALJA,
é um diamante polido.
Como miríada estelar, seus membros
são facetas cintilantes deste tesouro!
Cada ponto um ter- feito;
cada sucesso, mais um degrau.
Num tempo, uma queda, um desmaio,
quase a morte!
Com sorte, a mão de um amigo a levantar.
Até um sorriso, meio a lágrimas...
Ainda tem o porvir, na esperança regado.
ALJA, hoje este é seu símbolo:
- Diamante Lapidado!

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Lamento da Natureza


Observo com curiosidade
a movimentação inquieta do meu jardim.
Se é como bem me lembro,
quando chegava setembro,
vinha com ele a primavera.
Era tempo de calmaria, do colorido de flores
e de chuvas cantantes refrescando
nossas tardes. O calorão só vinha no verão!
Agora, a natureza lamenta em coro:
Quero água! Quero água!
Céu azul,  manchado do branco das núvens,
iluminado sob o dourado do sol,
acolhe o bem -te - vi que abraça seu filhote
e chora a chuva que não veio.
Sobre o verde desbotado do abacateiro,
geme a corroíra em busca de alimento.
Aqui, a sabiá a lamentar o dia inteiro
que o vento já vem, sem argumento,
a levar a molhadeza, pras bandas do mar...
No canto do muro, a murta sem lágrimas,
engole um soluço e suspira por um banho!
O voo colorido do beija-flor tenta
abraçar o manacá e nova dança inventa
que lhe poupe energia e o alimente.
Mente quem diz que a natureza não pensa.
Pensa e sente como gente.
A natureza sabe que os rios
estão - se tornando riachos,
prenunciam córregos até trilhas de terra
socada e seca; enrugada  e craquelada.
Ouço nos pios dos pássaros
a prece de toda a natureza, que em coro
suplica: que venha a chuva, bom Deus!

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Ainda Sobre Crianças

Nunca gostei de datas marcadas em calendário oficial, para se homenagear os pais, as mães, avós, crianças e mais uma infinidade de títulos, aguardando um abraço, um elogio, talvez um presente.

Criaram um dia - 12 de outubro - para pensarmos, presentearmos, abraçarmos e beijarmos nossas crianças como se isso não devesse ser algo natural, como o rio que corre para o mar; como o fogo, que  ateado deve queimar. Se tenho crianças sob meus cuidados, filhos ou netos, diariamente é meu ritual beijá-la, de manhã, convidá-la a se lavar, ajudá-la na escovação dos dentes, penteá-la e estimulá- la a observar o belo dia que se inicia. Depois, preparar-lhe o desjejum. Os muito pequenos exigirão bem mais  de minha atenção, com múltiplos mimos: amamentar, ou dar mamadeira, trocar-lhe as fraldas, cantar e ninar para fazê-la dormir...

 Quanto aos  maiores, precisarei orientar suas tarefas escolares e levá- los a outras atividades complementares, tais como jogar tênis, ou futebol; natação ou balé... O relógio segue correndo e a mãe ou o pai, gastam a porção de seu descanso, realizando a mais digna função do amor. Sobram ainda o dentista, aulas de idiomas ou de matemática. A escola bíblica ou catecismo e o piano. Aparar os cabelos e comprar algumas roupas ou cartas de Pokemon também entram na rotina. Darei a esta criança grande parte de meu tempo, cuidando dela desde o nascer ao pôr - do- sol.

O amor me exigiu brincar com minhas crianças de muitas maneiras:
Dramatizei muita estória, sobrando para mim sempre o personagem malvado: já fui o Lobo, a Bruxa, a Fera...Também já me fiz de fraca para me pegarem no Pega - Pega e me arrastei pelo chão a me esconder sob camas ou segurei o riso ou a respiração, atrás de portas ou cortinas. Já brinquei de fazer comidinhas, em lindas panelinhas, fingindo comer o sanduiche de feltro que imita pão, salada e carne! Lembro- me de ter caminhado pela sala, com joelhos e mãos no chão e uma criança sentada, nas minhas costas, como se cavalo eu fosse.  Já cantei muito com crianças, mesmo sendo completamente desafinada. Joguei bolinhas de gude com meninos e pulei corda com meninas. O " jogo - da - velha" envolvia meus netos que vibravam quando vovó distraía e eles ganhavam, com a coluna de tres cruzes ou tres círculos.
Joguei boliche e bola - ao - cesto, errando de propósito, para que a minha criança se sentisse feliz e competente. Empurrei carrinho e contei muita estória clássica e outro tanto retiradas de minha tulha mental. Desenhamos e recortamos e colamos muitas figuras...

Há uma festa especial pelo seu aniversário e o Natal. E as chegadas de viagens de avós, tios, amigos e  padrinhos: em todos esses momentos, a criança recebe seu presente, simples ou pomposo.

Tem sempre alguém que a ama para colocá-la a dormir, sobre plumas, em uma cama ou berço, num quarto arejado, protegida de todo mal.

Certa amiga concluiu que falo muito sobre crianças maltratadas; disse que exagero, que não é tanto assim. Ponderei que acontecem amarguras na vida de dezenas de crianças das quais nunca falei. São crianças sequestradas, não se sabe com quais propósitos; crianças, recém - nascidas, jogadas no lixo ou no mar; crianças muitas, na rua - abandonadas ao vício; desesperançadas; outras tantas abusadas, torturadas em suas próprias casas...

Por isso, sempre terei um poema em homenagem a esses anjos, mutilados no corpo ou na alma. Por isso, meu poema denso, duro de assimilar poderá levar malvados à reflexão transformadora!

Crianças de Rua

Mais crianças na rua!
Acordam com o caminhão do gás;
dormem cobertas pela lua
e sonham sonho fugaz...

Mais...Muito mais bebês na tua
porta deixados, aliás
pela pobreza crua
que a ignorância traz.

Pequeno do lazer o momento,
sem família nem pão.
Permanente do abandono, o lamento!

Leva-os a Deus a oração,
cheia de amor e quebrantamento,
sem vaidade ou hesitação...

sexta-feira, 3 de outubro de 2014

Quase Rotina

Não é toda noite que perco o sono. Apesar de madrugadora, estou sempre a prometer que escreverei durante o dia, logo após a caminhada. E, quase toda noite, as horas passam correndo por mim, que abro mil janelas, na Internet; abro-as também em meus diretórios e vou fechando-as vagarosamente até que meu velho relógio de parede entoe badaladas frágeis, tão cheio de anos e cansado está, como eu mesma. Alguém, do lado de lá do meu computador, tem como função avisar-me que " fulana ou beltrana atualizou seu status"! Diz que " você está perdendo muitas histórias!" Se, num piscar de olhos, num cochilo mínimo, aperto a tecla do facebook, adeus escrita; é o enterro de boas reflexões, no mínimo um repousar mais calmo. E, minhas santas amigas, na boa intenção, postam o bolo que fizeram sem usar ovo ou o caneco de chopp - é isso mesmo? Não consigo inspirar-me vendo um caneco de cerveja até nesta primavera com cara de verão! Há coisas interessantes e notícias dos amigos. Mas, o tempo é excludente; se você aceita a pilula dourada das redes sociais, estará desistindo do alimento da sua alma. Para mim, escrever é como o ar que respiro.

Por tais atalhos da distração e outras sombras veladoras do foco, minha imaginação degola os vigilantes da disciplina. A partir daí, leio a Folha, o El País, o Le Monde...Dou uma espiada no Times e sigo até as notícias do Vaticano. De repente, saio da armadilha da curiosidade e já as horas se desvaneceram; sumiram nalgum vão enegrecido da madrugada. Desisto, então, e prometo que amanhã será diferente...

Perdido o sono que zomba de mim em gargalhadas, fico curtindo o brilho alaranjado de lembranças de minhas crianças bronzeadas. E estas memórias se envolvem em saudade de um tempo em que a dos cachos - cor - de - mel distribuia seus dias entre tubos- de- ensaio e cadinhos, dançava em requebros de braços e pernas, em aulas de dança e sobre o azul da água da piscina ou se lançava sem medo, sobre as barras da ginástica. A outra, com sua enorme e farta franja curtia dedilhar seu violão, quase de seu tamanho, de criança de sete anos. Segurando minhas pesadas pálpebras, caminha sobre meu travesseiro o menino travesso que já não sobe mais em árvores nem se arrisca a nadar no lago do clube. Essas robustas imagens saudadeiam minha emoção e se derramam em gotas ardentes. Não é de tristeza que as lágrimas me socorrem. Desde muito tempo, minha alegria é molhada. Pois quando tive muita dor, chorei por dentro e só os olhos de minha alma ficaram vermelhos.

Tentarei correr para o leito; agarrarei o sono com determinação, agora que ele se anuncia cobrando o tempo que ontem lhe foi roubado. Para que a insônia não seja minha quase- rotina.
 

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Momento Atual

No centro dos dias, ela,
a piranha devoradora;
a implacável corrupção!
Seu parceiro, o poder.
Também insaciável, destruidor!
Corroendo, sugando
toda a energia do povo!
E faltando o ar da Justiça.
Já tivemos juiz e muitos políticos
presos e logo soltos.
Não queremos o teatro
mesmo o circo ou a vaia!
Queremos o dinheiro da moradia,
da comida, da escola, da saúde...
Quem diria:-
Se o juiz é conivente com o réu,
quem o condenará?
O povo condena o político ladrão;
o povo reclama justiça.
Eu sou o povo!

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Luminosa Vida

Fique sempre no mais alto.
Como claraboia proceda.
Seja a translucidez seu alvo.
Ao lutífero não ceda.

Não siga o lucífugo,
fugindo da luminosa Verdade.
Seja sua transparência fogo.
Sua alvura a caridade.

Pequena ou grande lucarna,
o importante é vazar luz,
de sua defesa, arma.

Luz solar, fogaréu, luz de vela.
Seja luzerna que seduz.
Leve o Eterno por ela.

" Se a luz que há em ti são trevas, quão escuras serão as tuas trevas" - Jesus, o Cristo.

Luminosa Vida.

segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Construindo Saudade...

Perdi o sono ou foi ele que se escapou de meus olhos, fugiu de meus sonhos, empurrou-me para fora da cama. Quase duas horas da madrugada meio fria, saindo quase do inverno. Já tinha ido pra cama meio tarde, após degustarmos um bom vinho que eu trouxera de Montalcino. E fiquei ali na penumbra do quarto, julgando que logo dormiria. Mas, fui construindo saudade, na ansiedade de  repassar toda a viagem que acabara de fazer, pelo Norte da Itália até o Lácio. Sei que construi muitas boas memórias que gerarão intensa saudade! Começamos por Milão, ficamos em Verona - uma gracinha! - interessante ver como muita gente gosta de entrar de corpo e alma na ficção. No pátio da casa de Julieta, seu balcão provocava intensa fila, daqueles que desejavam tirar uma foto para lembrar, como se fora verdadeira a história criada por Shakespeare. E, o muro do lado esquerdo da entrada estava coberto de bilhetes; juras de amor, quem sabe? Realmente, é contagioso o inconsciente coletivo: quase dava para ouvir o apaixonado Romeu declarar seu amor à mocinha cujos pais proibiram o romance...Seguimos para Veneza, que eu já visitara e que me pareceu um pouco descuidada. Estão sempre em obras de manutenção, o que atrapalha um pouco.

Depois de uns tres dias, visitamos o belo lago Como, tendo muitos a curtir suas margens, em roupas de banho. Meus netos se permitiram entrar na água e nadaram alegremente...

Andando ali pela Ligúria, a lembrança enreizada na memória, trouxe-me a saudade de minha mãe, na bandeja de polenta, bem do jeito que ela a fazia. Alguns, a fizeram muito espessa, densa; outros rala como sopa de doente. Esta polenta era como um pudim, firme e macia ao mesmo tempo. Veio meio feia, meio pobre em sua aparência. A polenta que mamãe fazia era gostosa e bonita de se apreciar. Vinha coberta pelo vermelho do molho, engrossado pela carne moída. E, óbvio, neste molho moravam a cebola, a salsa, o alho mesmo o manjericão, tudo na medida certa. Por vezes, tínhamos o queijo ralado a enriquecer. Contudo, a polenta foi um diferencial muito apreciado, quando sumiu de nossas opções, dando lugar apenas às massas, com molhos sofisticados.

Cinqueterre foi uma bela experiência, onde visitamos diversas ilhas, velejando como aconteceu nos canais de Veneza. Todos esses lugares são lindos, e mais saudade pude edificar.

Ficamos uns dias nas alturas esplendorosas de Montalcino. Montanhas e planícies mescladas de muitos tons de verde; manchadas nas nuanças do rubro ao alaranjado, detendo-se no ouro acobreado. O azul sem núvens envolvendo a paisagem na atmosfera aveludada. Saiu, então, de minha saudade a Mantiqueira de meus cuidados. Só ganhou de minha mineira, pela pradaria totalmente desenhada em suas videiras enfileiradas; em oliveiras carregadas. Na varanda onde tomávamos o café - da - manhã, ainda uma figueira, fazia robusta sombra e levava -me ao pomar de minha infância. Minha mãe fazia um invejável e transparente doce - de - figo, delicioso presente para nós e aos vizinhos.

Esta parte mais agrícola, com suas ruas estreitas e edificações antiquíssimas foram um enlevo para para meu coração. Será uma saudade colorida, diferente, antiga e culta. Saudade sem idade; eterna enquanto eu viver...

Passamos por Pisa, Lucca, Firenze e, de Roma, atravessamos para Sardenha. Esta lembrou-me o sossego e isolamento de algumas praias do Nordeste brasileiro. A transparência da água, como a de Fernado de Noronha. Foi um tempo de descanso muito rico.

Voltamos a Roma, num verão efervescente, pelo sol e a multidão que enchia as ruas. Prefiro a Europa na primavera. Há quem goste de enfrentar as férias com milhões de outros que buscam os mesmos lugares. Alguns precisam aproveitar as férias escolares. Como as belezuras de meus netos que solidificaram as bases da saudade que construi neste agosto de 2014.

Não posso deixar de dizer que a macarronada de minha mãe era melhor que todas as pastas que comi naquele paraíso de massas. Vou dar um consolo, estas do lugar de origem chegaram bem perto daquela que minha mãe fazia aos domingos. Também, há aquilo de saudade que me faz valorizar muito mais a comida de minha mãe. Talvez fosse apenas diferente.

E as melodias me reportaram aos bailes do Clube Itajubense e do Diretório Acadêmico da EFEI, como a charmosa " Champanhe", que certamente construiu saudade em muita gente.

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Meu Relógio

Meu relógio preto e velho,
pendurado na parede da cozinha.
Ninguém te ve, ninguém te sente.
E a alegria que tenho é só minha.
Ninguém percebe teu cansaço,
Tuas falhas mesmo teu silêncio.
Por tantos anos foste minha alegria,
tiquetaqueando meu tempo,
pondo ordem em meus dias.
Meu querido relógio preto,
de rosto  dourado, luminoso
e som virtuoso,
incomodando ouvidos sensíveis,
na madrugada!
Ponteiros certeiros, a ausência marcando
de um amor que prometera voltar!
Não te deixarei calar,
mesmo cantando em descompasso
e, como eu, já claudicante.
Pois devagar  também sigo nesse passo:
ti...que, taque, tique,tiquetique...taque,
ta... ta...que, que...tictac.

segunda-feira, 30 de junho de 2014

Tempos

Tempo de pra dentro caminhar,
na solidão da maturidade,
vivenciando muita saudade,
reciclando o jeito de amar.

Vem o gosto da liberdade.
Sem regras nem leis - rebeldia!
Mas sinto a vida vazia.
Nada vale tal vaidade...

Na juventude, as correias, os laços;
as obrigações, lutas sem fim!
Nada de risos nem abraços.

Hoje, há um pêndulo dentro de mim:
- como máquina moldada a compasso,
quando digo "não," ele diz "sim." 

sexta-feira, 13 de junho de 2014

Retalhos da Vida

     A vida de cada um e de todos nós
     é como colcha de retalhos;
     como veste de palhaços,
     mesmo roupa de espantalho!
     Nenhuma vida só de branco se veste
     nem de puro ébano se tece,
     num fio feito de aço,
     que nunca se rompa...
     Assim, os retalhos de nossos sentimentos.
     Ora vermelhos, ora cinzentos;
     azuis, alguns julgamentos;
     outros, densos retalhos de lã...
     Somos revestidos desses retalhos,
     renovados ou envelhecidos...
     Que os retalhos de sua vida
     não sejam remendos rotos,
     senão nacos perfeitos de luz e amor!

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Mães ( Homenagem a todas )

Uma roga pelo filho doente,
outra, pelo que não aprende;
mais uma agradece pelo contente
que desfruta do emprego buscado
e ter o inferno superado!
A vida de todas as mães
é joelho no chão; é peregrinação,
sob chuva fraca ou forte.
Muitas seguem sem norte,
que seu rumo foi tragado pela morte
de um filho amado!
A mãe se arrasta, um passo de cada vez.
No altar se prostra e agradece a sorte.
Na certeza, não no talvez,
de ter a graça recebida,
de sua Mãe Aparecida!

quarta-feira, 30 de abril de 2014

Mistério: cortina de fumaça.

     Conversa vai, conversa vem, sempre uma delas desemboca nas dificuldades do mundo e do Brasil, que não é mais o sonho -de - consumo de estadunidenses e europeus. Outra conversa divaga sobre nuvens espessas de campeonatos de futebol. Tudo muito previsível, nenhum mistério. Porém, no fechar os olhos cansados da noite, alguém sempiterno suscita um tiquinho de mistério a temperar o começo da madrugada.
     Mistério: cortina de fumaça, véu anuviando nosso entendimento...
     Seria a vida um mistério ou mistério impermeável é a morte?  Esta, uma emblemática senhora vestida de negro a segurar enorme foice aguarda impaciente sua próxima vítima ou - quem sabe?- alguém que a saiba amiga. Ela nos lembra que é preciso não ter pendências, não adiar as coisas, sobretudo as da alma. Constantemente, ela espreita atrás da porta. Aguarda sem pressa; sabe que o tempo é seu aliado. Esta figura abstrata, sinistra até humilde para alguns se contrapõe à senhora Vida. Símbolo de Vida? Pode ser luz, alvura azulada, o sol mesmo, tudo isso é símbolo de Vida. Mas explicá-la quem pode? Nasce alguém, em madrugada gelada, dentro de um iglu confortável. Na mesma hora, nasce outra pessoa num país tropical,cuja temperatura local é de trinta e nove graus, dentro de um barraco, onde a carência total chora de todo lado. Ambas estarão prensadas entre o nascer e a derradeira hora; ambas levarão vidas semelhantes; sofrerão alternadamente. Também ganharão bocados de felicidade, dependendo do olhar de cada uma sobre o mundo. Mistério da consciência humana. Aquela caminhará sobre difícil estrada; esta trilhará caminho fácil, materialmente, com muitas lágrimas de perdas, de apertar o coração. Uns cumprirão suas metas. Outros serão ceifados muito cedo, no alvorecer de seus dias. Pouco ou nada sabemos do como e do quando daremos adeus e seguiremos a senhora vestida de luto. Isso é mistério. Viver é correr riscos. E morrer? O que será o morrer?
     Lá pela década de setenta, ouvíamos curiosos as notícias de que aeronaves e navios desapareciam como passe de mágica, desde 1945 sem deixar vestígio algum. Tinham marcado como um triângulo imaginário o centro do oceano onde tal fenômeno ocorria com frequencia. Um ponto próximo a Miami marcava a posição sudoeste deste triângulo; Bermuda marcava o ponto norte e Porto Rico o sudeste. O espaço compreendido entre esses tres pontos chamou-se " Triângulo das Bermudas."
Minha comadre nordestina cre piamente que todos esses desapareimentos misteriosos aconteceram a pessoas altamente espiritualizadas que teriam sido arrebatadas ao céu, conforme citação bíblica. Outras teorias falavam de alienígenas ou que ali existia um portal do espaço. Certamente tinham visto muitos filmes duvidosos de ficção. Especulações para o mistério não faltaram. O tempo cumpriu seu itinerário e navios e aviões devem ter procurado nova rota de tal forma que havia muito tempo não se escutava mais do mistério de o mar sugar enormes embarcações e esquadrilhas inteiras, sem deixar rastro!
     Então, agora ouvimos que faz já um mes que o Boeing 777 da Malaysia Airlines está desaparecido sem esperança de que seus destroços sejam encontrados. Seria outro " Triângulo das Bermudas" em nova versão, no Oceano Índico? É atentar bem sobre o provável local do ocorrido e aguardar se novos sumiços ocorrerão.
     Ontem, meu neto me ligou. Sua voz de criança, nos seus seis anos incompletos, era puro júbilo. Seu primeiro dente havia caido e, certamente, a misteriosa Fada - do - Dente passaria por lá para fazer a troca: levaria seu dente e lhe daria um presente. Insistiu que eu fosse lá para ver esta coisa surpreendente e inexplicável que era ter um vão no lugar onde havia um dente! Ali, bem na frente. Algo fantástico! Fui lá. O menino estava maravilhado. Mirava- se no espelho e aquela imagem que via não era ele mesmo. Era outra pessoa muito diferente. Esfregava o dedo naquele vazio avermelhado, como se procurasse uma explicação para o mistério! Haveria já ali por baixo outro dente prontinho para aparecer? Viria logo ou agora era seu momento de curtir uma situação diferenciada, de pertencer ao novo grupo de banguelas? Aquele privilégio era, afinal, para poucos em sua classe de colégio.
     Assim, é que cada um de nós tem seus próprios mistérios. Mesmo que o mistério seja apenas a queda do primeiro dente - de - leite, a feitura do algodão - doce ( aparece no ar e some na boca, sem ser mastigado) ou uma estrelinha - símbolo da bisa que foi morar no céu - até um duende de jardim. Basta o olhar atento ao andar pelo mundo porque os mistérios estão por toda parte.    

sábado, 12 de abril de 2014

Sobre uma criança

A frágil criança -
que medrava na dor
e desalento -
era, neste momento,
robusto carvalho,
sob o orvalho,
de vaga melancolia,
sem medo da tempestade,
pulando com euforia,
sobre ciladas de falsidade.
Segue, na vida,
um caminho de pedra e lama;
ouve a voz de Deus
que a chama
e aguarda sua resposta.
Nenhuma regra imposta.
Só o amor importa.

sexta-feira, 14 de março de 2014

Chuva na Madrugada

A leveza do vento
vem brincar na palmeira.
A galhada se alegra
e, no ritmo, dança.
A atmosfera alegria promete
até uma festança!
Juntam-se as mãos em oração.
A chuva! Precisamos da chuva!
Água em cúmulos escuros
esconde o sol.
Soletro a prece em gratidão,
já prevendo a oferta dos céus.
Que chova uma chuva como confetes
ou serpentina.
Não repentina, em granizo,
 a destruir lavouras e casas.

Bendita a chuva que cai como bênção;
Bendita esta cantilena molhada,
que vela meu sono, na madrugada.

domingo, 2 de março de 2014

Argumentação

     Que sua mente lhe diga
     que ele é bom, é legal.
     Que a emoção que você sente
     é perfeita, sem igual.
     Não deixe que ela invente
     armadilha ou traição.
     Não passe seu amor na peneira.
     Nem faça nenhuma asneira!
     Não brigue por picuinhas
     nem faça de seu querido
     bode expiatório.
     O caldo amoroso leva ervas, vinho,
     carinho até uma pitada de perdão.
     E pimenta, como o olhar
     de mulher ciumenta.
     Faça assim que o amor floresce
     e por muito tempo permanece.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

O Clamor das Ruas

     O grito que vem das ruas
     não é grito de guerra.
     Mesmo vindo dos sem - terra,
     dos sem - teto, dos sem - nada.
     O clamor, então, por que seria?
     Não seja, pois, enganada.
     Aqui não é a Síria!
     O malfeitor mascarado,
     mal - ajambrado
     não é criança
     ingênua, sem esperança.
     Não pode portar
     paus, pedras nem lança.
     Não deve quebrar vidraças,
     pôr fogo em ônibus,
     impedir sua paz
     nem roubar sua vida.
     O clamor das ruas é legal.
     É adestramento da cidadania.
     Não creia na fantasia
     de ser melhor dentro de casa,
     a fugir do dever.
     Não se acorrente ao medo.
     Medo é solidão, terror.
     Medo é escuridão.
     Não carrega amor nem união.
     Coragem!
     O limite do medo
     é o brilho da luz divina
     que está em você!
    
    

quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Do Caminhar pela Vida

     Na estrada da vida,
     peregrina rumo ao Eterno,
     enveredei-me por vias frias,
     ou de intenso calor,
     no desamparo ou com amor.
     Determinada, levei no bojo,
     o riso e a lágrima,
     espinhos e rosas,
     nas cidades e nas roças.
     Como pessoas, as rosas
     são perfumadas e lindas,
     mas ferem, às vezes.
     Meus joelhos reclamaram
     e minha vista se turvou.
     Meu corpo se cansou,
     claudicou e se curvou.
     Porém, cada pedra pisada
     foi em nuvem transformada
     que não feriu meus pés.

     Feliz é quem completa a jornada
     e encontra a porta de chegada!
    

sábado, 18 de janeiro de 2014

Boa Morte

      Faz já algum tempo que quero falar deste assunto. Minha filha enviara- me com entusiasmo a notícia sobre o valoroso atleta belga, Emiel Pauwels. O senhorzinho das mil medalhas ( ouro, prata, bronze ) - a recebê - las desde sua juventude, tinha agora 95 anos! Ele falecera neste último sete ( 07) de janeiro, tendo optado pela eutanásia. Eu estava cansada e focada em conversas de doenças, de parentes e amigos e não me detive a valorizar  sua perseverança. Ele se dedicara ao atletismo com empenho e conquistara seus muitos premios até tornar-se um dos maiores da Europa, em sua categoria de veteranos. De fato, eu deveria deter-me neste fantástico progresso, tendo ele atravessado idades tão limitantes até desanimadoras.
      Não são muitos os países que aprovam e executam a eutanásia. Temos os Países Baixos, Luxemburgo e Suíça na iminência de aprovação, a Colômbia e, nos Estados Unidos, somente o Estado do Oregon. François Hollande - presidente francês - acaba de anunciar lei que regulamenta o final da vida de pacientes terminais, para encerrarem seus dias " com dignidade". Segundo o juramento de médicos, eles devem fazer todo o possível para recuperar a saúde de doentes; mesmo aqueles portadores de doenças incuráveis. Temos visto verdadeiros milagres em que há recuperação espantosa, sobretudo para os que gostam de viver. Tivemos dois doentes terminais na família e estes agiram corajosa e tranquilamente até o fim, apesar de grande sofrimento. Nenhuma revolta ou desespero, constatamos.
      Pode acontecer, como já ocorre na Bélgica, que ninguém mais se espante nem questione com o emprego da eutanásia, dentro de poucos anos.  Praticada desde a Antiguidade, a eutanásia era empregada pelos celtas e outros povos nórdicos, que queriam apressar a morte de seus pais idosos e enfermos. Há quem afirme que eutanásia é como um suicídio assistido. Contudo, num olhar investigativo, concluimos que o suicídio é praticado pela própria pessoa que o escolhe. A boa - morte uma vez pedida e aceita é assistida por um médico e quem a executa é uma terceira pessoa.
      O que me surpreendeu foi que Pauwels realizou uma festa, no dia anterior ao de sua morte. Convidou alguns amigos e seu filho único. Dizem que estava feliz.
      Talvez eu tenha sido severa demais com ele. Aos noventa e cinco e com câncer de estômago, sabia que não mais faria seus esportes e poderia ter muitas dores. Ainda não tinha sofrido nada disso. Neste último dezembro ganhou medalha de ouro, na Copa do Mundo Brasil 2013 ( veteranos). Só de pensar nas limitações e sofrimento preferia morrer. Não tenho o direito de julgar sua escolha. Meu conceito é que a vida é um dom e só o Criador a pode recolher para si. Porém, com medicamentos poderosos ninguém precisa partir como acontecia no passado.
      Seria eu hipócrita a dizer que aplaudi a escolha do atleta. Ele poderia aceitar o último torneio, às vezes longo e sempre dificílimo, mas experiência ímpar e intransferível. Custava o belga correr só mais esta vez na estrada da vida? Atravessaria o vale sombrio da morte e saberia que do outro lado ainda há muita vida a ser vivida.
      Deus me encha de coragem e paz, quando eu tiver que atravessar a ponte da eternidade; quando o sino tocar e eu tiver que me mudar para o andar de cima. Que ninguém me ofereça eutanásia. Não precisarei de festa nem de carpideiras.

domingo, 5 de janeiro de 2014


Janeiro
 
     Fechou- se definitivamente o portal de 2013; estamos,agora,no início de um novo ano.Obviamente,ao redor tudo parece igual;novo - ano - quase - igual - ao - velho.Só um pequeno “quase” para fazer justiça às variações enlouquecidas de temperatura. Aliás,o calor está atípico! Nada nem ninguém se transforma abruptamente. Mesmo a morte é vagarosa.Por isso,muitos vêm morrendo faz tempo e nem o percebem.
     Foram- se as festas também as pessoas se foram para seu nada, suas férias ou suas faias.
     O que foi bem concluído assim ficou.Os erros também.Talvez se consertem naturalmente,segundo a lei do retorno ou algo semelhante à Teshuvá judaica.Aguardemos.
     Na festa do Réveillon, perambulei entre idades variadas e especulei sobre protestos,projetos de mudança,suspiros até lamentos. Para uns,se a festa de Natal é de família,o foco deveria ser a criança.Portanto,a ceia ficaria para segundo plano ou nem existiria. Todavia,há a geração que passou dos sessenta e não se alimenta de “coisas pesadas”nem noite adentro quase de madrugada.
     Seduziu- me a conversa com “seo” Antônio.Na tranquilidade de seus oitenta e tantos anos,enquanto aguardávamos a ceia,ele contou-me de sua rotina.Cuidava ele mesmo de tudo em sua casa,embora pudesse pagar funcionários domésticos.Habitualmente,janta por volta das dezoito horas;tudo organizado,faz suas preces e logo está a sonhar com o dia seguinte ou coisas da infância,mesmo com alguma namorada.Acorda sem despertador;por vezes,sem o cantar do galo; escuro ainda.Faz o desjejum e segue de carro para o sítio.Ali, ordenha vacas,alimenta galinhas,rega a horta,cumprimenta o pomar...Eu,suspensa na admiração,ele,alegre,sorrindo,em paz.Isso era o seu jeito de levar a vida.Se tinha dado certo até ali,por que mudaria? Seu ano–novo seria como os muitos anos–velhos,deixados nas páginas de sua vida.Ouvindo“seo” Antônio,reforcei a crença de que o trabalho que se ama não pesa quase nada.O corpo se renova a cada dia quando a alma está feliz.
     Confortou-me,ademais,o propósito da solene senhora de ser menos manipuladora e mais verdadeira; menos fantasiosa e mais religiosa, sem usar máscara de beata.E a jovem altiva definira seu ano-novo como a busca da esperança e da fé. Houve quem falasse de perdão e amor sem limites. Outros prometeram ler muito mais – tais como “ O Príncipe da Privataria", de Palmério Dória,( o segundo volume está melhor que o primeiro),a“Fúria de Sharpe”,de Bernard Cornwell ou reler “A minha Fé”,de Hesse,“ Terra dos Homens”,de A. Saint Éxupery; tomar fôlego para investir em “Gênese de um Pensamento”,de Teillard de Chardin e ainda criar coragem para mastigar o denso “O Demônio do Meio- Dia”,de Andrew Solomon. Haja tempo!

     2014 que se alargue para caber tanto desejo acumulado. E que os sonhos se tornem realidade.
     Então, feliz ano – novo – quase - igual, para todos!