sábado, 18 de janeiro de 2014

Boa Morte

      Faz já algum tempo que quero falar deste assunto. Minha filha enviara- me com entusiasmo a notícia sobre o valoroso atleta belga, Emiel Pauwels. O senhorzinho das mil medalhas ( ouro, prata, bronze ) - a recebê - las desde sua juventude, tinha agora 95 anos! Ele falecera neste último sete ( 07) de janeiro, tendo optado pela eutanásia. Eu estava cansada e focada em conversas de doenças, de parentes e amigos e não me detive a valorizar  sua perseverança. Ele se dedicara ao atletismo com empenho e conquistara seus muitos premios até tornar-se um dos maiores da Europa, em sua categoria de veteranos. De fato, eu deveria deter-me neste fantástico progresso, tendo ele atravessado idades tão limitantes até desanimadoras.
      Não são muitos os países que aprovam e executam a eutanásia. Temos os Países Baixos, Luxemburgo e Suíça na iminência de aprovação, a Colômbia e, nos Estados Unidos, somente o Estado do Oregon. François Hollande - presidente francês - acaba de anunciar lei que regulamenta o final da vida de pacientes terminais, para encerrarem seus dias " com dignidade". Segundo o juramento de médicos, eles devem fazer todo o possível para recuperar a saúde de doentes; mesmo aqueles portadores de doenças incuráveis. Temos visto verdadeiros milagres em que há recuperação espantosa, sobretudo para os que gostam de viver. Tivemos dois doentes terminais na família e estes agiram corajosa e tranquilamente até o fim, apesar de grande sofrimento. Nenhuma revolta ou desespero, constatamos.
      Pode acontecer, como já ocorre na Bélgica, que ninguém mais se espante nem questione com o emprego da eutanásia, dentro de poucos anos.  Praticada desde a Antiguidade, a eutanásia era empregada pelos celtas e outros povos nórdicos, que queriam apressar a morte de seus pais idosos e enfermos. Há quem afirme que eutanásia é como um suicídio assistido. Contudo, num olhar investigativo, concluimos que o suicídio é praticado pela própria pessoa que o escolhe. A boa - morte uma vez pedida e aceita é assistida por um médico e quem a executa é uma terceira pessoa.
      O que me surpreendeu foi que Pauwels realizou uma festa, no dia anterior ao de sua morte. Convidou alguns amigos e seu filho único. Dizem que estava feliz.
      Talvez eu tenha sido severa demais com ele. Aos noventa e cinco e com câncer de estômago, sabia que não mais faria seus esportes e poderia ter muitas dores. Ainda não tinha sofrido nada disso. Neste último dezembro ganhou medalha de ouro, na Copa do Mundo Brasil 2013 ( veteranos). Só de pensar nas limitações e sofrimento preferia morrer. Não tenho o direito de julgar sua escolha. Meu conceito é que a vida é um dom e só o Criador a pode recolher para si. Porém, com medicamentos poderosos ninguém precisa partir como acontecia no passado.
      Seria eu hipócrita a dizer que aplaudi a escolha do atleta. Ele poderia aceitar o último torneio, às vezes longo e sempre dificílimo, mas experiência ímpar e intransferível. Custava o belga correr só mais esta vez na estrada da vida? Atravessaria o vale sombrio da morte e saberia que do outro lado ainda há muita vida a ser vivida.
      Deus me encha de coragem e paz, quando eu tiver que atravessar a ponte da eternidade; quando o sino tocar e eu tiver que me mudar para o andar de cima. Que ninguém me ofereça eutanásia. Não precisarei de festa nem de carpideiras.

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