sexta-feira, 25 de dezembro de 2015

Dia de Natal

O loiro  de certos cabelos ficou  mais brilhante, o caminhar queimado e cadenciado da morena seduziu a muitos e o grisalho de uns poucos impôs o respeito à mesa. Proibidos os eletrônicos - nada de redes sociais nem mensagens de grupos, a conversa fluiu alegre, descontraída,  com olhos -nos- olhos, e direito a sorrisos...
Isso tudo porque é Natal.

Ficamos, eu e meu marido, cada qual em uma cabeceira da mesa. Os outros se acomodaram como quiseram: nada de lugares marcados. Fiquei feliz que meu marido conduziu uma singela oração de gratidão e respeito a Deus, pelo amor que nos tem demonstrado na pessoa de Jesus Cristo. Depois do jantar, as crianças queriam se lambuzar no marrom do bolo de chocolate. Cantamos o " Parabéns " para o Menino Jesus e todos os quatro netos fizeram questão de soprar a velinha: portanto cantamos quatro vezes a mesma canção congratulatória. Depois, vieram as outras sobremesas. Tudo muito tranquilo, com alegria sem estardalhaço: a um canto, um pequeno Presépio - a Lapinha apenas. No próximo  ano quero fazer um maior e mais bonito. A neta caçula ainda tem um bom tempo para entender como os meninos já entendem - a festa é do aniversário de Jesus. E o Menino Jesus tem um entregador dos presentes que ele mesmo nos dá: o figurante é o Papai Noel. Se não educarmos nossas crianças, este velhinho nem sempre justo em seu presentar, leva toda atenção e recebe todos os créditos, numa sociedade cada vez mais materialista, consumista e egoísta.
 Para que uma parte da justiça seja feita é bom que as crianças saibam que seus papais, mamães e outros muitos, são os que compram seus desejados brinquedos. Pois que nem perguntam por que o bom velhinho não oferece brinquedos lindos e caros aos pobrezinhos? E, antes da tão esperada noite, meus netos encheram duas sacolas com ótimos presentes para doação e abriram espaço para os novos que nesta noite natalina receberam.

O bom de tudo isso é que, sendo Natal, muitos se perdoaram e deixaram no esquecimento poucas ou muitas ofensas; porque é Natal deram de si mesmos visitando doentes, partilhando vida, roupas, alimentos e brinquedos, em creches, orfanatos, asilos e hospitais. Que possamos seguir neste ritmo durante todo o Ano Novo, fazendo de cada dia comum, um dia especial. Este seria o milagre do Natal. Porque o sentimento de amor e amizade; de colaboração e de paz não deve acontecer apenas uma vez por ano, no dia do Natal.

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Da Colheita ao Chatô

Faz um bom tempo - e como faz! - participei de um projeto ( hoje extinto) da Federação das Entidades Assistenciais de Campinas, FEAC quando, então, selecionavam obras de arte, com temas natalinos e os transformavam em sugestivos cartões de Natal. Numa dessas oportunidades, um quadro de minha autoria fora escolhido para se tornar um cartão e ajudar com sua venda as entidades filiadas. Minha base inspiradora era uma paisagem rural que eu havia fotografado, no Sul de Minas, antiga parada dos trens, lá nos idos de 1800. O bucólico lugarejo chama-se Estação Dias. No fundo, as ondulações verde - azuladas da Mantiqueira sob um cerúleo de poucas nuvens. A um canto, focado e enquadrado com apurado olhar, erguia-se uma capelinha e um casario de parcos e opacos telhados de um vermelho envelhecido e queimado. Para sugerir uma ideia de fartura, afastei este cenário e coloquei uma plantação de trigo, em primeiro plano. Seria praticamente impossível encontrar-se trigo por aquelas bandas. No entanto, um recorte de jornal, mostrava uns camponeses, recolhendo trigo, numa fazenda do Rio Grande do Sul. Era apropriada a foto, apesar de ser em preto e branco. Um chapéu amassado, naquele formato viciado de quem sempre o segura com a mesma mão e com o mesmo gesto. Pareceu-me bom o resultado. Poderia ter-lhe dado o título  de " Campo de Trigo", " Fartura" ou outro qualquer, pois que o título em uma obra é o que menos importa. Mas, numa armadilha do destino, ou numa leve cruz a carregar, pus -lhe o título de " A Colheita". Pelo menos para duas ou três criaturas expliquei meu processo criativo, já que maliciosamente me dizia uma : Você é a Van Gogh de Campinas - talvez fosse um elogio ou um deboche disfarçado; outra, este chapéu é bem parecido com os dele ( Jesus! Percorri muitos trabalhos deste maravilhoso artista e  não encontrei nem um chapéu que ao menos de longe tivesse um traço daquele!) Uma terceira, com cara do opositor bíblico, destilou veneno de pura inveja ou frustração! Eu não entendia o porquê de tamanha agressividade.  Entristeci-me não ao ponto de  me adoecer. Mas conclui que muitos não suportam pessoas em seu nível de competência ou acima de seu narcísico destaque! Apesar de ter participado de muitos salões oficiais, ter recebido menção honrosa, medalha de ouro e participado de mostras coletivas e individuais, larguei a pintura, como ocupação principal e parti para a escrita, sobretudo para a poesia. Não espero ser reconhecida, contudo decepções podem acontecer.

Observo com atenção o que ocorreu com o ator, diretor e produtor Guilherme Fontes. Talvez, por inexperiência não administrara bem suas captações e seu próprio dinheiro ao desenvolver seu filme " Chatô - o Rei do Brasil", só agora, após vinte anos, nos cinemas. E quantas calúnias, suposições maldosas até condenações suportou. E não se sabe quanto gastará com multas ou se ainda deve muito. Imagino seu alívio ao apresentar este trabalho que tem recebido críticas positivas. Deve ter passado um inferno, nesse tempo todo. Imagino que, se no meu ínfimo caso as pessoas maldosas se ouriçaram e soltaram seu veneno, quanto mais neste cenário de fama e dinheiro! Que receba seus merecidos louros e retorno financeiro. Pois a fogueira de vaidades que ronda o mundo das artes, em geral queima até os ossos!

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Ópera de Copa e Cozinha

      Ia falar de outra coisa. Mas, lembrando a alegria contagiante de minha mãe - ela se chamava Maria Conceição - certamente homenagem a Maria, mãe de Jesus. Mamãe cantava enquanto fazia suas tarefas domésticas; às vezes chorava, como quase todo mundo chora, quando não esconde a dor. Mas sua característica marcante era o canto e o riso, largo, generoso de orelha a orelha. Na verdade, todo mundo alegre lembra-me de mamãe. Assim, também foi com Tereza.

Tereza seduziu - me com sua garganta de cristal ou seriam cordas vocais de ouro? Esta amiga especial tem seu registro vocal como soprano - creio eu em minha total ignorância musical. Já cantou em coros de óperas e corais, em teatros de Vitória, no Espírito Santo. A moça é de palco! Fazia muitos anos em que não nos víamos, apenas trocando frases no correio eletrônico. Tivemos uns dias de trocas emocionais, valiosos. A Internet é seca, fria. Não nos beija nem nos abraça; não nos olha nos olhos.
Depois dos efusivos beijinhos e abraços, olhares e exclamações; depois de ela dourar a cebola e murchar os tomatinhos, depois de almoçarmos o rosado bobó - de- camarão, tomarmos um reserva cabernet sauvignon e apurarmos o paladar com o alaranjado da sobremesa de mamão maduro, mesmo ao cafezinho Tereza ainda não tinha exibido sequer uma nota musical. Depois, uns foram cochilar, outros conferir seus e-mails até varrer a sala vi que fizeram...Havia sempre tarefa para quem se oferecesse.
Fomos eu e ela para a pia, apesar de seus protestos para que fosse usada a lava - louças. De repente, estava ali a soprano a solfejar um trecho de Carmen - Ópera de Bizet - com todas suas nuances e meandros, como um rio que sobe e desce ou despenca em cascata :
"...L'amour, l'amour, l'amour, l'amour...
L'amour est enfant de bohème. Il n'a jamais, jamais connu de lois.
Si tu ne m'aime pas, je t'aime. Si je t'aime prend garde toi...mais  si je t'aime..."

E eu que não pio nem como pardal, estava a fazer coro com ela como se de música entendesse. Mesmo porque amo a língua francesa e esta ópera é das mais populares!? Continuamos em nosso ensaio nos outros dias: enquanto eu descascava batatas e as amassava, minha amiga artista - seduzida por Bizet - preparava uma torta. Cantávamos  culminando naquela apoteose! A louça foi lavada, enxuta, lustrada e guardada em seus devidos lugares. A torta ficara pronta. Tereza estava iluminada! Sua alma vazava alegria por todos os poros; faíscas divinas nos envolviam! E, ao " grand final", caímos na gargalhada como crianças travessas: éramos Pavarotti, Carreras, Domingo, quiçá a grande Callas!...Cheguei a ouvir aplausos, podem crer!
Isso é o que passo a chamar de " Ópera de Copa e Cozinha".

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Chorar pra Dentro

Ele chegou meio constrangido e confessou-me como um pecado se confessa, como se fora enorme fraqueza:" Estou muito angustiado. Meu peito aperta, o ar se nega e sei que, se eu chorasse, ia sentir-me muito melhor". Olhei-o  nos olhos e amei-o profundamente. Aqueles olhos deveriam estar ardentes pois vermelhos estavam. Abracei-o fortemente e sussurrei-lhe aos ouvidos que de fato, os olhos são as portas por onde deixamos ir embora com as lágrimas, toda mágoa, toda frustração, todo desencanto. Até brinquei cantarolando a tão popular: " Quero chorar não tenho lágrimas, que me rolem nas faces pra me socorrer. Se eu chorasse, talvez desabafasse o que sinto no peito e não posso dizer. Só porque não sei chorar eu vivo triste a sofrer..." Ele sorriu-me um risinho amarelo e me apertou mais forte junto a si. Senti certo tremor por todo seu corpo. Certamente, emoção e lágrimas retidas. Continuou a dizer-me que desde muito menino acostumara-se a reter as lágrimas, lá num canto escuro do coração, porque a regra paterna era a de que aquele que chorasse apanharia mais ainda! Então, ele esperava passar o mau momento e seguia em frente sem alarde.

Expliquei a ele que isso não era deixar de chorar. Isso era o que chamo de chorar pra dentro. Quando a dor é muita, as lágrimas enchem o vaso interior e sobra um pouco que sai muito timidamente, à noite sob as cobertas ou durante um banho, para escorrerem disfarçadas, diluídas n'água que cai do chuveiro. Mas a dor permanece no peito, ela fica agarrada ao coração e sufoca mesmo! Há quem passe muitos anos chorando pra dentro - seja pelo tombo moral de um colega de trabalho, por uma traição amorosa, algum abuso sexual, a morte de um ente querido , humilhações de todo tipo. A pessoa não tem lágrimas a lhe socorrer - somatiza um câncer, uma depressão, no mínimo um silêncio mortal.

A dor corre ao lado da alegria Da mesma forma como se esconde a dor e não se soltam as lágrimas, também o riso e alegria podem ser falsos. A pessoa passa a cantar "só porque não sei chorar eu vivo alegre a sorrir." Finge felicidade.. Não é clássico ser o palhaço a pessoa mais triste do circo?

Repeti muitas vezes  a meu filho, desde menino e vida afora:" homem chora, sim, viu?" Quem diz que homem não chora nada entende da vida. Homem e mulher deveriam aprender o valor e a medida certa das lágrimas. Elas são preciosas; são como diamantes. Lágrimas verdadeiras lavam nossa alma, limpam o espírito e renovam nossas energias.

Eu mesma já chorei muito pra dentro. A garganta e os olhos ardem e nenhum alívio acontece. Repito, nada de reprimir o pranto;  choro é resposta de tristeza, assim como o sorriso é a resposta da alegria . Vamos praticar as emoções e deixar que as manifestações delas surjam naturalmente.

Combinei com ele de partilharmos nossas tristezas  assim como dividimos as alegrias. E, se rimos na leveza dos encontros também podemos somar nossas lágrimas, ainda que reduzidas cá fora, pois somos iniciantes na arte de vazar  sentimentos molhados. E você, por favor, não engula os sofrimentos porque lágrimas retidas formam um lago que se torna em doença. Sorrir é bom e lindo. Chorar é nobre e saudável.

terça-feira, 22 de setembro de 2015

Decisão

Ontem, encontrei-me com Olguinha, minha amiga de infância. Estava bastante triste, carregando a melancolia causada com a recente perda de sua mãe, aos 89 anos de idade. Final áspero e exaustivo pois sua mãe perdera a lucidez, fundamental para minimizar o trabalho de filhos e cuidadores. Foi uma surpresa ouvir dela - sem muita conexão com seu desamparo e dor - a respeito de sua decisão - tomada há cerca de quarenta anos - de não se casar.

Éramos amigas - irmãs e ela me contava quase tudo, do pouco tudo que era nossa vida, naquela pequena cidade, no sopé da serra da Mantiqueira. Até os 21 anos não tivera namorado  nem um amigo tivera. Naquele tempo, meninas direitas não tinham amigos. Podiam ter colegas de classe cujos olhares não se cruzavam. Incrível, como poucas moças namorassem os colegas de classe. Eram como irmãos. Ou talvez porque os outros mais velhos passassem a ideia de serem mais responsáveis. Foi assim que num dia qualquer, Olguinha me disse que estava namorando um tal de Walter. Fazia apenas uns vinte dias e ele chegava até perto de sua casa mas não entrava. Só entraria depois de meses, se estivessem muito bem afinados. E a cada manhã, enquanto viajávamos de ônibus - escolar para  dar aulas numa escola distante, ela me contava sobre o jeito do namorado. Numa noite, ele lhe trouxera flores e nem era seu aniversário! Na semana seguinte, bombons. E ela falava disso com desdém, com risinho debochado mesmo. E eu lhe dizia que isso era prova de amor, no mínimo sinal de boa educação ou de uma tática romântica para conquistá - la.  Assim foi acontecendo por uns sete meses e ela a reclamar das gentilezas do bom moço. Uma vez, confidenciou - me que eram muito parecidos, por isso ela não o queria: não eram os opostos que se atraiam? A reposta estava ali; a começar pela estatura, a cor morena da pele - " ele consegue ainda ser mais queimado que eu" - não ligar para cinema nem bailes...Cismava até que ele dizia não gostar de cinema só para concordar com ela. E isso a irritava ainda mais. Pois bem, numa manhã de domingo resolveu acabar com esse lero- lero : falou de repente, sem muito pensar, pois se pensasse era capaz de não dizer. Depois disso, o tempo voou nas asas de um colibri ou de alguma coruja agourenta. A mãe até chorou. Moço como aquele era muito difícil de encontrar: médico competente, bom  caráter, não era feio. Mas, quando não se ouvem sinos - diz a lenda - é porque aquele não é o tal. Até agora, aos 69 anos não ouvira as badaladas do amor. E nem ela mesma notara que se arrependera de ter dispensado o homem que lhe demonstrara tanto amor! Só com a morte da mãe, o silêncio barulhento não a deixa dormir!

Quando se é jovem, talvez se queira experimentar os diferentes tipos de emoções, sentimentos realçados por homens desiguais. E, numa dessas decisões equivocadas, dispensamos a pérola preciosa e ficamos com o cascalho. Ou fazemos como Olguinha que ficou sem ninguém. Envolveu-se com a mãe que casamento é algo muito trabalhoso e filho, nem pensar!

Certa ela ao dizer que se arrependera daquela decisão juvenil, foi um desabafo. Contudo, ainda na velhice é possível arranjar um companheiro. Perguntou -me se eu sabia do Walter. Bem que sabia: estava casado e com três filhos, morava em Taubaté. Menti que não sabia. Pra que alimentar um arrependimento que já machucava tanto aquele coração?

Prometi telefonar muito mais e passar lá de vez em quando. Mas quem nos garante que nosso companheiro ficará conosco por toda a vida? Se viveu sem ele até agora, o resto da jornada deve ser bem mais curto.   

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Prognósticos

Eu muito criança e via minha mãe sair, à noite, para acompanhar procissão no mês de maio, quando as pessoas levavam uma vela acesa e todos acompanhavam uma imagem de Maria, com o nome de N. Senhora de Fátima. Por muitos anos, eu cresci vendo este cenário de fé, sem muito ou nada entender desse ritual.
O tempo passou e os prognósticos eram os piores: até o fim do século XX, ao terminar a II Guerra Mundial- caso o quadro de agressões entre os Estados - Soberanos não se atenuasse - certamente teríamos a III Guerra Mundial. Como acréscimo teríamos os terremotos, as inundações, os vulcões; completando com os fenômenos no Universo. Naquele tempo, muitos falaram do fim - do - mundo, um sinônimo de fim- dos - tempos. Entramos para o século XXI com um modelo de Guerra Fria, um vocabulário repetitivo de Nova Ordem Mundial - que mais da metade da população não sabe o que é, mas repete a frase como mantra sagrado. De repente, o meio ambiente tornou-se mais importante que uma criança faminta. Cuidar das plantas e dos animais é dever de todos; tratá - los como divindades é panteísmo. E o grito ensurdecedor do momento é a grande ameaça do Aquecimento Global.
Ouvi mais de um professor - Phd na área - a dizer que há muitos interesses particulares e econômicos, atrás dessa orquestração.
Uns entoam o hino sobre a mudança do Sistema : político, econômico, social e religioso. E a mudança - outra palavra mágica que entra em qualquer discurso político - mesmo sem sentido.
Os fugitivos de países em guerra, não são criminosos. Contudo, esse fenômeno é novíssimo no quadro mundial. Nós tivemos desde muito tempo, desde os portugueses, os africanos, espanhóis, italianos e alemães; ainda japoneses e sírio - libaneses. Atualmente, o Brasil recebeu oito mil refugiados sírios; anteriormente, os haitianos foram acolhidos.

Só para fechar, hoje falam de um garoto islâmico que havia feito um relógio, como atividade de sua aula de Ciências - foi tomado por terrorista, algemado e humilhado...

A elite global vaticina que teremos um aquecimento climático que levará ao fim nosso planetinha Terra.
Mas isso só ocorreria lá pelos anos 2379 da Nova Era. Ou como pensam alguns, poderá acontecer esta tragédia, no próximo dia 25 de setembro, de 2015 -  dizem alguns mais apavorados!
Não adiantariam mais procissões nem velas acesas.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

Esperar e crer

Que posso eu fazer
além de crer e esperar?
Creio que este sol, este dia lindo
não existem só para mim.
Muitos vão por ele seguindo,
como tu, sorrindo, cantando
e eu curar meu coração apaixonado
estou tentando!
Meus dias se ancoram
junto aos que choram,
aos que carregam emoções densas.
Tanto tempo já passou  que pensas
ter eu de ti me esquecido.
Porém, em cada noite insone,
em cada dia amanhecido,
é teu rosto minha lua e meu sol!
No escurejar de meu hoje,
tu és a esperança de um farol.
Que posso eu fazer, então,
para teu regresso acontecer,
senão esperar e crer?

terça-feira, 25 de agosto de 2015

Surpresas

Nestes dias passados, ainda em agosto, ganhei uma fantástica surpresa! Algo nunca experimentado nem imaginado. E não consigo exprimir com exatidão os sentimentos que despertaram em minh'alma, as emoções que me invadiram sem me avisar.

         Já vi a morte muito de perto, também em surpresa, quando eu - nos mal- completos dezoito anos, fui designada pela minha mãe a conferir o que havia acontecido, em casa de minha avó, pois de lá - casa próxima à nossa - meu tio gritava assustado. Minha avó tinha uns oitenta anos e sofrera um tipo leve de AVC, que a limitava em seu caminhar; não, porém, no entendimento e na fala.
Foi automático meu proceder, impensado mesmo; ela estava voltada para a parede e eu a revirei para meu lado. O lado de fora da cama. Ela estava morta! Talvez tivesse falecido logo de madrugada. Eu estava vestida para ir ao colégio. Minha mãe ainda estava deitada; quem se levantava primeiro e preparava o café era meu pai. Então, busquei uma bacia com água morna, sabonete e uma toalha pequena. Um absurdo o que fiz! Dei-lhe um banho ali na cama, como fazem com doentes; vesti-lhe meias longas e finas, as roupas íntimas e um belo vestido preto de boa seda. Penteei seus cabelos e espalhei abundantes gotas de perfume.
Mas, esta é outra história, que me rendeu meses de pesadelos chocantes. Contudo, cito este fato, como outros semelhantes, quando digo que visto minha armadura de Joana D'Arc e enfrento a turba, nos caminhos tortuosos de alguma grande ou pequena dificuldade. Pareço de pedra para amparar as dores alheias. Poderia não ser assim, mas não quero desmoronar junto ao outro que está despencando. Preciso ser forte e amparar o sonho desfeito ou a dor que esmaga o coração.

          Tive muitas boas surpresas; mas envoltas em expectativas. Surpresa como me deram, porém, é difícil de explicar. Fui levada num envolvimento sutil, de meias palavras, de argumentos  vagos e de repente uma porta se abre e vejo-me num torvelinho de emoções boas e ricas; risos e rostos os mais inesperados, os jamais imaginados ali, naquela noite! Pessoas de muito longe, outras de perto; umas raras em meus dias outras mais presentes: todas brilhando em carinho, amor, luz. Naquela sala havia afeto de avó, de mãe, de filhos e de netos. Nos meandros da amizade e da ternura, senti o ruflar de asas angelicais de nora e esposo; sobrinhos e irmãos. Eu era Alice e tinha entrado no buraco da árvore; fiquei sem chão, sem a minha armadura; estava totalmente vulnerável. Então, as lágrimas desceram sem constrangimento. Aos poucos, muito lentamente, voltei à realidade e pude olhar os mínimos detalhes que a "grande equipe" me tinha proporcionado: vasos de pimenta, envoltos em tecido, pequenas jarras com florinhas minúsculas, vidros de pimenta etiquetados " Boteco da  Regina"; toalhas floridas e todos os doces que mais aprecio: quindins, olhos - de- sogra, bolo de coco e docinhos de nozes. Ainda me arrumaram um vídeo, com parte de minha história! E contrataram um músico e seus pares, para executarem músicas adequadas ao boteco e aos presentes. Sou grata ao bom Deus que me proporcionou este presente e a todos que o tornaram possível.
Agora, sei o que é uma surpresa sem a menor expectativa! Uma surpresa ótima, mas é preciso ter um coração muito forte, porque faz balançar todo nosso ser!

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

Lições dos livros e dos filmes

Tanta agitação, tanto temor de que invadam nossa conta - não somos nenhum vulto importante nem pretendemos fazer mal a ninguém. Contudo, sempre estão a cuidar de nossa privacidade. É realmente estressante, guardarmos as diferentes senhas -  cada vez mais sofisticadas - com letras e números. Amigos e parentes a criticar-me por não ter " sap" ou "zapzap," como brincam. Dizem que combinam almoços, jantares, orações e muito mais. Elas não tem mais paciência para lerem nem enviar e-mails. Tudo fazem pelas redes sociais e mensagens que trocam enquanto assistem a um filme ou novela a conversarem com quem está na sala. Querem fazer tudo ao mesmo tempo...

Gosto muito de conversar de frente, olhos nos olhos, vendo as reações faciais, a calma ou agitação que a prosa provoca. Nestes últimos anos, tanto neste Brasil como nas grandes nações do mundo, a maioria anda muito agitada até sem saber a verdadeira razão que age subversivamente. Há uma nuvem escura, densa e perversa pairando sobre nossos dias, sobre nossos sonhos e ameaçando nossos parcos nacos de paz. Gosto de conversar com alguns, enquanto comem peixe cru e molhos à moda japonesa, com outros que preferem o filé ao molho madeira e um bom vinho. Então, num desses dias, ela me falava do filme Elysium. Uma elite vivendo fora do planeta Terra, na abundância de tudo o que desejavam. E, neste planeta, a maioria vivendo miseravelmente, na fome, na dor, no abandono. Pude recordar-lhes, o livro "1984", de George Orwell - que tornou-se filme - que vi e revi muitas vezes - para analisar e entender a mensagem; para não ser apenas uma diversão, mas um real  alerta sobre uma sociedade global controlada por uma elite que dita o que se pode e o que não se pode fazer. São todos monitorados, no trabalho, nas ruas e dentro de suas casas. E não é isso que, aos poucos vamos buscando ou somos manipulados a suportar até gostar? Logo vamos querer as câmaras " sorria, você está sendo filmado" - que já nos perseguem pelas ruas e salas de consultório - vamos querer que estejam a nos " proteger " enquanto dormimos...E, se por acaso, trocarem uma letra de meu nome ou um número  de meu registro, poderei ser presa sem direito a explicações. Estes filmes e livros de ficção científica são proféticos, no meu entender. Economista renomado me diz que avançamos rapidamente para este estado de uma minoria, uma ponta da pirâmide, a elite global estar na fartura, na saúde, na riqueza e no prazer e a multidão, na fome, na miséria, na loucura animalesca e cruel.
O "Admirável Mundo Novo" - de Aldous Huxley nos afirma que aqueles sobreviventes viverão felizes em completa escravidão - pois que foram manipulados, sofreram lavagem cerebral e são preguiçosos para pensar...Nesta linha, vemos o que fazem com nossas cabeças a propaganda a nos vender desde um perfume, um celular, um petisco até um candidato ao posto mais alto de uma nação. Então, rolam as mentiras envoltas em papel celofane, as promessas que nunca serão cumpridas.
Mais um para nos assombrar, Herbert George Wells - mais conhecido com H.G. Wells - com seus muitos romances de ficção. Nada muito assustador, se os tratarmos como diletantismo de quem sonha demais: a sociedade é totalmente anárquica, os bebês todos de proveta. Família tradicional, monogamia, privacidade, e pensamento individual criativo constituem crimes.
Consegue enxergar algum paralelo com os dias atuais? Ouvimos daqui e dali que há diversos modelos de família, fraturadas  acidentalmente pelo falecimento ou separação do  pai ou da mãe. Ouvimos que " faça como você quiser": duas mães lésbicas e nenhum pai; dois pais homossexuais e nenhuma mãe; também pode ser de quatro ou mais que se chamarão " cuidadores". É, assim fica melhor. Ninguém ficará humilhado. E seu marido pode ter duas ou três esposas ou a mulher terá quantos homens quiser, ao mesmo tempo. Quando parece que demos um passo em direção à ética, à moral, ao respeito, ao amor; damos um retorno ao animalesco, ao brutal, ao pornográfico. Tudo em nome da paz. Aqui, paz é sinônimo de desordem. Também os relacionamentos não devem ser duradouros. Não havendo paixão nem religiosidade, ficaremos como seres bestiais.

Pouco diferente destas obras, vemos o filme "Jardineiro Fiel" a denunciar os grandes laboratórios, onde sempre o lucro é quem dita as ordens, pelo crime de criarem as doenças e, em seguida, venderem a cura. E o livro " Poder Global e Religião Universal" de Juan C. Sanahuja. É a Igreja da Nova Era; a enorme tenda abrigando  as grandes denominações. De fato, não é para viverem em polêmica sobre qual religião é a verdadeira ou melhor. Mas, cada qual ficaria em sua crença, como amigos. Ouvimos " Um só rebanho e um só pastor." Só que este rebanho mundial não pensa de modo homogêneo; pois que se houve separação desde muitíssimos anos é porque são divergentes. E esta reunião apenas justaposta não promove o " um só coração, uma só alma."

Esses livros parecem proféticos ou alguma eminência parda está a seguir-lhes os rastros, como etapas não de um mundo melhor, mas de um mundo cada vez mais materialista, egoísta a plantar destruição.
Anunciam um desprezo pela vida, sobretudo pelos velhos e enfermos. E, temendo a superpopulação mundial, já limitam os tratamentos de idosos e deficientes de qualquer idade.

Se leio tais livros e vejo tais filmes, eles são minhas janelas para o mundo. Contudo, o que me alimenta o espírito é a meditação, à sombra do arvoredo, com o sussurro da água ou do vento; com o canto dos pássaros e um azul celeste, lavado em luz, anunciando esperança, n'Aquele que venceu o mundo

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Amada Língua Portuguesa

Amada Língua Portuguesa

Amo nossa língua - mãe:
" Última flor do Lácio, inculta e bela."
Razão de ler e escrever vejo nela
e de ouvir cantar uma canção popular:
- " gosto de sentir minha língua roçar
a língua de Luis de Camões."
Gosto de eu mesma falar:
-" Eu te amo, minha mãezinha!"
E saber o que é sentir saudade,
que não é memória nem piedade,
que é ter o coração partido,
na partida de um grande amor!
Amo-te, língua de Amália e Saramago,
nas rimas de Pessoa, que nunca destoa,
neste mundo desconstruido,
essa Babel das letras!
O poeta diz, num suspiro profundo:
-" Tenho em mim
todosos sonhos do mundo!"
Amo-te, nos versos de Drummond,
nos contos de Machado
e nos achados de Rosa.
Amo-te língua do mar,
do passado, de hoje e do futuro,
impregnada de nostalgia,                      
embalada nos fados, noite e dia,
brilhando n'América e n'África, afinal,
n'Ásia e na Europa, com Portugal...
Nunca será demais de ti zelar,
em prosa e verso em ti me expressar,
como n'Odeão de Atenas!

Esta é minha singela homenagem aos oito séculos da oficialidade da língua portuguesa, cujas comemorações finalizaram-se neste junho próximo passado.

sábado, 23 de maio de 2015

O Tempo é Vida

Andei muito, muito tempo envolvida com politicagem, da feia, da grossa; daquela pseudo-política que machuca; deixei o tempo escapar pelo vão dos dedos.
Andei mais um bocado de tempo a matutar sobre o verdadeiro ton de azul dos olhos de vovô Maneco e se os olhos de minha mãe eram azuis ou verdes...
Gastei horas com as coisas de fora, coisas sem valor, quase bobagens mesmo. Um bom feixe de horas foi investido matando lagartas que teimam em matar meu manacá - de novo! Quando dei por mim, já era fim de abril e eu lutando contra artrite com armas pouco convencionais: fingia que não sentia dores, mas estas arranhavam-me os olhos e o couro cabeludo; apertavam todas as articulações e a irritação do sono só de pesadelos fez-me irritada e chata...

Não conseguia ler nem escrever nem conversar eu queria. Para completar, a gripe gritou exigindo seu tempo de atuação. Nesse quadro de negação total de dias normais, não percebia o dourado do sol beijando as ramagens nem a leveza da trepadeira, carregada do carmim das rosinhas minúsculas. Não me entretinha com o canto do sabiá, não pendurava banana para o sanhaço, não falava mais com beija- flores. Era como se tudo tivesse saido do seu contexto: sem cor, sem som, sem encanto - tudo apagado pela dor física e pelo lixo emocional que eu deixara acumular em meu espírito e ruminava nos momentos de puro silêncio. Era a violência, a corrupção, a roubalheira, a hipocrisia e o cinismo de muitos. Era uma pátria à deriva, sem comandante, sem rumo!.

E o Tempo continuou girando, porque ele, o Tempo, faz seu serviço sem parar.

Foi então que percebi que meus encontros comigo mesma, minhas conversas com meu Mestre e Senhor estavam muito contaminadas. Eu poderia ter pensado tudo o que pensei, sofrido todo o pequeno - grande sofrimento que sofri de modo muito mais suave e produtivo se tivesse ido ao encontro d'Ele em profundidade e entrega. Mas ainda tinha tempo. Voltei a minha capela interior. Ali, o tempo parou. No silêncio de meu coração, acendeu-se a Luz! Sosseguei o espírito no Espírito e a paz escorria em alegria que penetrou cada poro de meu corpo...O Senhor me ensinou que nosso tempo é precioso. Não é para vivermos na correria, na agitação. Também não deixar o tempo esvair-se como o sangue que sai de ferida mal cuidada. O tempo deve ser acariciado com bela música, boa leitura, com amigos, com as minhas crianças. Sobretudo aos pés do Senhor, devo viver o meu precioso tempo!

Saindo da capela interior, estou tomando umas coisinhas para artrite, outras coisinhas para o resfriado e a vida está entrando de novo nos trilhos. Hoje, já matei lagartas arrogantes, reguei plantas sedentas e lacrimosas; cuidei do sanhaço e sondei o beija-flor que não veio. Mas sei que virá.

Vi que o tempo gira e gira muito depressa, sobretudo se não estamos construindo na paz que vem de Deus. E, se o tempo gira e nada se faz nele é vida que se perde. E vida perdida gera aquele olhar de zumbi que ve tudo sem cor e sem sentido. Estou feliz; voltei à vida!

domingo, 12 de abril de 2015

Bárbara Heliodora

Como vimos e ouvimos em muitos veículos de comunicação, a escritora, crítica de arte e professora - talvez com outros títulos mais - Bárbara Heliodora falecera nestes recentes dias passados, aos 91 anos bem vividos. O destaque para sua eficiência nas profissões que escolhera fora do rigor na pesquisa exata, na profundidade e sinceridade de seus comentários ou avaliações, sobretudo como crítica de arte, derrubando alguns espetáculos e levantando uns poucos. Ouvi que muitos atores e diretores ficavam estressados com sua presença na plateia. Outros a observavam durante a apresentação tentando, de antemão, saber se ela tinha gostado ou não do espetáculo.

Enfim, levou consigo muitos elogios e suas obras e seus conhecimentos, sobretudo sua total admiração pelo grande W. Shakespeare.

Não conheci muitas Bárbaras na minha vida; apenas a filha de uma amiga e a nora de outra. Ambas muito bonitas. No entanto, o composto Bárbara Heliodora, só conheci esta senhora, nunca, porém, pessoalmente...Só que, ao saber de seu passamento, uma tristeza profunda abraçou minha emoção e logo percebi que tal sentimento era destinado à outra Bárbara Heliodora.

Refiro-me a Bárbara Heliodora Guilhermina da Silveira, poetisa e amada esposa de Inácio José de Alvarenga Peixoto - um dos participantes da Inconfidência Mineira. Prefiro lembrá-la apenas como Bárbara Heliodora, mulher forte, de espírito artístico e grande incentivadora do marido e, inspiradora do movimento dos inconfidentes. Mãe de tres filhos, teve a maior dor pelo falecimento de uma filha e a tristeza de ver o esposo, Alvarenga Peixoto, preso e condenado ao degredo perpétuo em Angola, na África, onde faleceu.

Observando um retrato de Bárbara Heliodora, em óleo sobre tela, encontrado nos porões da antiga Fazenda Boa Vista, em São Gonçalo do Sapucaí - no Sul de Minas - vejo que era muito bonita, de feições delicadas e elegância no vestir. Sofreu ainda o que, segundo o escritor Alberto Carlos da Rocha - difamação da Corte para anular a escritura de venda de alguns imóveis que lhe teriam sobrado: ela foi declarada demente.

Continuou trabalhando na agricultura e mineração, nas cidades de Campanha e São Gonçalo do Sapucaí.  Sua produção literária foi muito reduzida. Lembrada pela poetisa Cecília Meireles, surge no poema " De Dona Bárbara Eliodora" que integra o seu Romanceiro da Inconfidência.

Nascida em 1759, na cidade mineira de São João del- Rei, faleceu em São Gonçalo do Sapucaí, em 1819, sendo enterrada na Igreja Matriz, desta cidade.

Duas grandes "Bárbara Heliodora"- dois destinos completamente diferentes. Apenas especulo se a mãe desta última Heliodora ( que disseram o Bábara ser apenas pseudônimo) - não pensara na Heroína da Inconfidência para lhe dar este nome tão forte.
Confesso que o desbotado de meus olhos cansados se lavaram em lágrimas de compaixão pela mãe e esposa, farta de injustiça, que veio a ser ferida de morte ao separar-se de seus queridos. Muito triste! Ainda não assimilei bem o drama desta família e daquelas  dos outros inconfidentes, ainda mais que celebraremos neste 21 próximo, a horrível  morte de Tiradentes. Temos muito para refletir!

quinta-feira, 19 de março de 2015

Imorredoura Saudade

Homenagem a Itajubá que aniversaria em 19 de março


Quando eu aqui vivi, querida Itajubá,
dançavas ao som das fanfarras,
cantavas nos pios de pardais
e na algazarra de cigarras, agarradas
às mangueiras da casa rosada
do saudoso Presidente,
na melancolia das tardes de outono...
Chamavas e choravas na cadência
dos sinos das igrejas...
Quando me separei de ti, Itajubá,
minhas retinas feri, na rotina itinerante
de buscar o azul exuberante
da Mantiqueira
e a sonolência do Sapucaí, serpeando
entre chorões e guanxumas...
Coisas que a vida já não me traz.
Meu sonho hoje se compraz
nesta robusta tristura, que triunfa
aninhada no relicário de meu coração:
noites geladas, névoa na montanha,
prosa alegre, pastel de milho, pinhão...
Então, voltei, Itajubá.
No Santuário da Virgem d'Agonia,
extática orei, em tamanha euforia!
Era o céu unido à terra,
o casario, o rio e a serra.
Tudo envolto no dourado do sol,
criando em mim,
imorredoura saudade!

terça-feira, 3 de março de 2015

Tempos Sombrios

Há uns dois anos, aproximadamente, minha afilhada do sertão mineiro, vindo visitar-me contou-me de seu entusiasmo ao ler " Cinquenta Tons de Cinza" - de E. L. James, pseudônimo de Erika Leonard James. Tentando entender seu entusiasmo, quis saber sobre do que se tratava. No entanto, minha afilhada, apesar de seus trinta e dois anos e um diploma universitário, disse sentir- se constrangida ao falar sobre o assunto. Desconversou quando lhe pedi o tal livro emprestado. Fiquei a imaginar e ri com meus botões refletindo sobre o pudor, talvez um respeito exagerado por mim. Não dei muita atenção ao fato, porque tenho verdadeira pilha de bons livros a serem lidos ou relidos. Pois costumo revisitar Teillard de Chardin, Tolstoi, Victor Frankl, Drummond, João Cabral de Melo Neto, a Bíblia e tantos outros cuja digestão me alimenta a alma e me faz mais forte.

O tempo seguiu seu curso e naqueles dias de fevereiro, durante o carnaval, me surpreendi, vendo em um canal de TV, uma verdadeira turba, que se apertava na porta de uma sala de cinema, onde assistiriam ao " 50 Tons de Cinza" agora, feito filme. Ali, percebi senhoras de meia idade e jovens; algumas com seus companheiros, maridos, namoridos ou namorados, outras muitas sós. Estampavam ares de vitória, transgressão ou certo recato. Acendeu-me a curiosidade. Afinal, minha afilhada é interiorana, mas esta turba era de São Paulo! Tinha ouvido que a senhora James estava rica com a venda de tantos exemplares. E, vendo a aceitação de sua obra, escrevera mais dois volumes - dando a um deles o " ton negro" e ao terceiro um clima de liberdade.

Fui ao cinema sem expectativa alguma. Vi senhoras, na casa dos sessenta ou setenta, eufóricas, com seu pote de pipocas e seu copo de refrigerante, cada uma, como adolescentes, naquelas filas, nos anos sessenta, lá no Sul de Minas! E se juntavam, gesticulando muito, rindo, falando alto...Foi com muita paciência que eu e meu marido conseguimos comprar nossos ingressos. Temos uma rotina semanal de ir ao cinema e, quase sempre, as salas estão bem vazias. Naquele dia, foi difícil conseguirmos duas cadeiras juntas.

O filme, para nós, foi muito fraco. Não era história romântica, não era pornografia nem drama. Bom, era a filmagem de cenas sadomasoquistas. Não sou cineasta nem crítica de arte. Falo só do que senti e percebi. A diretora, Sam Taylor Johson ( mesmo sobrenome da protagonista Dakota Johnson) não conseguiu passar-me verossimilhança em cena alguma. Aliás, pode ser que tenha seguido à risca o que a autora escrevera...

Ali, durante o filme, eu esperava que " algo" muito especial acontecesse, que justificasse o sucesso do livro. E me irritava com meus próprios questionamentos: estamos no século 21; a jovem é de último ano de universidade...Ser virgem vá lá. Mas não ter " ficado" com alguns garotos, nas festinhas que sempre rolam naquelas faculdades!? A moça tinha cara de caipira - certo me dirão - era o jeito de sua personagem. Mas não é isso que questiono; minha questão é que não se juntam:- uma moça assim, bem ingênua, ir aceitando as investidas do bonitão, sem mais nem menos. Não conseguiria ler este livro. Não pelas taras que apresenta, mas porque trata seus leitores como idiotas! Já vi historinhas em que a moça é atropelada por um milionário e logo ao ser socorrida se apaixona por ele. Depois, o magnata vai visitá-la no hospital e daí ao casamento é meio capítulo ou duas páginas. Tem algo a ver com aquela baboseira dos vampiros bonzinhos - Crepúsculo, Amanhecer etc e tal. O filme foi cansativo, chato mesmo. E poderão pensar que eu desejasse ver mais cenas de desvios sexuais. Não. Penso que trabalharam mal mesmo. Problema de direção ou do conteúdo do livro.

Fico a pensar  do que E.L. James vai encher seus livros. Os tons mais escuros do segundo volume vão-se aprofundar nas práticas sadomasoquistas. Se a moda pega, veremos a euforia de livros versando sobre pedofilia - mesmo neste filme ( que retrata o livro )  ouvimos que o senhor Grey foi abusado desde os 15 anos  até adulto por uma amiga da mãe. Recordo-me de um filme em que Michele Pfeiffer é uma como prostituta da Corte, encomendada pela mãe do jovem para introduzí-lo nos mistérios do sexo. Mas, sem taras. Lembro-me também de que o livro Lolita, andava pelas mãos das adolescentes, minhas colegas de classe mais levadas, logicamente escondido dos pais e das freiras do colégio. Algumas delas não terminaram o curso colegial - engravidaram-se e se casaram. Nós, sim, naquele tempo, éramos bobinhas e casávamos virgens. Algumas, mais libertas, avançavam o sinal. Seria lá atrás o golpe da barriga?

Não pretendo ler estes dois volumes que engordarão os cofres da senhora James. E, se for a mesma diretora a realizar os filmes e esses dois atores, seria perda de tempo tentar conferir. Dizem que Sam Taylor, a diretora, foi criada numa comunidade hippie e a mãe era divorciada. Hoje, muitos filhos pequenos tem pais separados,sem problemas. Mas, morar em comunidade hippie já é outra coisa. Hoje, com filhos adolescentes, tem um marido 27 anos mais jovem que ela. Será isso ou eu entendi errado?

Creio mesmo é que vivemos Tempos Sombrios: nem pretos nem brancos. Tempos sujos pela confusão e maldade. Tempos escuros, em que as taras, em vez de serem assunto de clínicas psiquiátricas se tornam papos de salas - de - visitas. E muitos jovens alienados pensam que, se não lerem estas estorinhas estarão fora do sistema! Logo pensarão em praticar tais desvios em seus relacionamentos, um tanto desgastados pelo pouco investimento mútuo. Outros, pela frustração do sexo feito apenas em quarto escuro sob as cobertas ou nem isso...E o amor? Onde andará o amor? O tal Grey foi logo falando que com ele não haveria amor. Foi sincero. E a mocinha - universitária do século 21- foi cegamente se entregando sem amor (!?). Se ao menos o perfil dela fosse de uma devassa! Eu, pelo que vejo hoje, ela até poderia ir de olhos bem abertos na fortuna do cidadão.

Tempos tristes os de hoje. Sujos como água barrenta, por isso, Tempos Sombrios!

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

Marias, o Neco e divagações

Neste vinte e quatro de janeiro, próximo sábado passado, faleceu a grande atriz Maria Della Costa - encurtamento de um longo e pomposo nome - aos oitenta e nove anos de idade. Bastantes anos, tenho que admitir. Esta Maria levou-me a lembrar outra Maria, muito mais íntima e muito mais amada. Da Maria atriz nem me lembro muito bem. Contudo, ao ouvir de seu falecimento, fui transportada a 1968, quando a Maria, minha mãe muito amada, assistia à novela Beto Rockfeller, da TV Tupi. Como algumas pessoas que conheço, minha mãe levava as novelas a sério. Então, Maria Della Costa vivia uma " socialite " muito rica e linda que se apaixonara por um pobretão inculto, porém charmoso.
A fórmula era a de sempre, só que na maior das vezes o homem é o rico, o príncipe encantado que se apaixona pela mocinha pobre. Às vezes, o primeiro encontro foi quando ele a atropela com seu luxuoso carro. Ela não se machuca, mas acontece a paixão à primeira vista.

Minha mãe ficava ansiosa para ver o próximo capítulo da novela. Falava com as vizinhas como se a personagem Maitê - vivida por Della Costa - fosse real; de carne e osso e se apaixonara pelo garotão sem tostão. Havia uma melodia de fundo, talvez o tema de Maitê e de Luis Gustavo, cujo nome na dita novela não sei agora, devia ser Beto Rockfeller! Penso que era uma música dos Beatles.

Então, desde domingo e ainda hoje, me vi  lá em 68, só ouvindo de longe, porque não curto muito novelas, minha saudosa mãe a comentar com meu pai aquela trama toda. E me vieram sentimentos muitos, desde nostalgia ( ah! nossa herança da alma portuguesa!) até uma pitada de remorso por não ter partlhado muito mais meus pensamentos e sentimentos com ela. Coisa que acontece a todos os viventes: depois que sofremos a perda, ruminamos uns "por que?" Por que não a visitei mais vezes? Por que não os levei a viajar? Por que não rimos muito mais? E, mesmo que tenhamos feito o nosso melhor, se temos amor, ainda julgaremos que poderíamos ter feito mais...

Nessas divagações noturnas, perturbadas pelo calor, refleti nas emoções densas que mexeram com muitos de minha casa; sentimentos de negligência, descuido até falta de amor em torno da morte do Neco. Foi uma grande perda apesar de ele ser apenas um simpático e cantante passarinho. Este calopsita estava conosco havia uns oito anos. Viera muito jovem e foi dado como presente para meu marido. Este lhe ensinara assoviar a melodia interpretada por Gal Costa -  " Teco- Teco- Teco". Neco a cantava inteira, com os graves e agudos, fazendo toda a sinuosidade que a melodia exigia. Tal registro não acontecera da noite para o dia. Foram muitos meses para ele memorizar a primeira parte e outros tantos meses para gravar a segunda. Depois, emendaram-se as duas partes. E isso era um espanto para quantos o ouviam e viam nessa apresentação. Neco parecia entender que era o centro das atenções. De lambuja dava uns " fiu...fiu!.." Nossos netos se encantavam com aquela avezinha de  corpo acinzentado, rabão longo, pontas de asas brancas e penacho com luzes amarelas. Tinha ainda uma pinta rosada abaixo de cada olho. Era bem bonitinho o Neco. Ele conhecia as passadas de meu marido que era quem o alimentava: ração e água fresca a cada manhã. Mal ouvia aquele som, punha-se a piar com insistência. Também era curioso vê-lo agitar-se quando o carro de seu dono entrava em casa. Ontem, aprendi um pouco mais sobre aves e animais em geral. Nós nos deixamos cativar julgando que o bichinho tem sentimentos como os humanos. E sofremos muito além do normal nos cobrando atitudes devidas a eles. Aprendi sobre eles e sobre nós mesmos:..." os poderes canoros e aeronáuticos de um pássaro...são para nós como para eles, o mais sutil dos nossos poderes meramente instintivos".
(  Subliminar - como o inconsciente influencia nossas vidas - Leonard Mlodinow). Assim, acalmei minha consciência e não mais me punirei ao lembrar-me de como o gato agarrou e levou o Neco, noite adentro. Para as crianças, inventamos um fim mais civilizado, mais palatável; menos selvagem ou cruel. Elas aceitaram que, ao ser atacado pelo gato, Neco voou para bem longe, onde vive feliz com seus iguais.

Misterioso é que entregamos à eternidade nossos queridos idosos ou doentes e seguimos em frente. E nos apegamos a esta avezinha como se fora uma criança indefesa que chamara por nós sem ser atendida. Este registro é para me convencer de que eu e você não devemos ter pendências emocionais com ninguém, como dizia o Walter, amigo de minha filha. Agora, estou em paz!

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Da Liberdade

Aprendi, desde muito criança, que somos seres livres. Temos, portanto, liberdade de escolha, livre arbítrio. Em tese, posso dispor de mim mesma. Aprendi também que essa liberdade sofre restrições quando eu limito o direito do outro.

Com todo o susto e muitos questionamentos, vi o ataque à revista "Charlie Hebdo"que, tristemente resultou em doze mortes, de seus principais caricaturistas. Reflito como pessoa comum, sem muito conhecimento sobre o conteúdo das charges que faziam. Ouço que eles se diziam ateus e no direito de blasfemar. Sim, quem em nada acredita pode zombar de tudo e de todos, à vontade. Também li que, pelo menos um líder islâmico, lhes dissera que tais zombarias poderiam causar ira aos fiéis seguidores de Maomé.

Hoje mesmo, li de um cronista da Folha de S. Paulo, que ter respeito por alguém não é coisa boa. E que não se deveria pôr um "mas" nas atitudes dos caricaturistas, ao se refletir se eles não exageraram em suas críticas ao modo de agir islâmico. Justificaram-se que o deboche costumeiro e contundente era endereçado também aos católicos e autoridades. Era o exercício da liberdade. Contudo, se estavam causando constrangimento e tristeza a outros, que os deixassem em paz.

Lembro-me ainda daqueles tais de " rolezinhos" que aconteceram em fins de 2013. Creio que não existem mais por força de alguma lei regularizadora. Não sou racista nem preconceituosa. Pessoas pobres e negras, bem ou mal - vestidas, podem e devem ir aos shoppings mesmo só para passear. Muitas vezes, tem dinheiro apenas para um sorvete de casquinha, do mais barato. E sabemos que tudo naqueles lugares é muito caro. No Brasil tudo é caro! Não são apenas os pobres que gostam de passear em grandes centros comerciais. Ali há maior segurança - neste Brasil, onde a cada dia se ouve mais de assaltos e mortes, por um quase nada - e o ambiente é mais fresco, neste verão incandescente.
Só que não vejo desculpa para duzentos jovens ( algumas vezes até muito mais) entrarem em alvoroço, todos juntos cantando música funk de ostentação (imagine o que é isso) - andando até correndo naqueles corredores estreitos; subindo e descendo escadas, fixas e rolantes, por onde andavam senhoras idosas, mães com crianças...No mínimo faltava bom senso. As pessoas que ali estavam, para comprar ou apenas estar não eram nem são culpadas por aqueles jovens de periferia se sentirem excluidos, fechados em sua miséria material, emocional e espiritual. Quem não rejeitaria este bando desgovernado que queria apenas "zoar, ficar e beijar?" Tirar a paz dos outros, assustar?

Então, muitos escreveram que eles eram uns coitadinhos, inocentes, uns amores maltratados. E a lei veio pôr ordem no comportamento da criançada: poderiam vir, não em bandos, gritando frases, correndo. Os menores de dezoito anos, deveriam chegar acompanhados de adultos. Isso é disciplinar, educar, palavras que muitos não querem ouvir porque isso é sinônimo de muito trabalho. Uma jovem disse que era tempo de  férias e ela nada tinha a fazer. Ficava, então, o dia inteiro  convocando os amigos pelas redes sociais. Ora, se esta "criança" tivesse a obrigação de cuidar ao menos das próprias roupas, não lhe sobraria muito tempo. Devemos ocupar bem o tempo de nossos filhos, desde bem pequenos. Sempre em esportes ou tarefas escolares e domésticas e menos redes sociais e Ipad e similares.

Estamos vendo e ainda veremos os desdobramentos deste ataque terrorista, em Paris. Estados Unidos, Inglaterra e o Vaticano ( quem diria!) já se puseram em  alerta de segurança máxima. Que isso não caminhe, em nome da Liberdade - para aos poucos irem tirando a nossa liberdade. Com a ideia de que vão -me proteger, já tenho mil olhos a me vigiar. Assim, vamo-nos acostumando com policiais por todo lado, pois o mundo não é mais um lugar seguro e o ser humano já não sabe conviver.

É preciso gravar que, se quero paz, devo ser promotora dela. Não devo fazer ao outro o que não gostaria que me fosse feito. Minha liberdade termina onde começa o direito alheio.